sexta-feira, 27 de novembro de 2009

DANOS MORAIS E MATERIAIS. PRESCRIÇÃO. APLICAÇÃO DA "REGRA ESPECIAL" APENAS AOS CASOS ORIUNDOS DE ACIDENTES DO TRABALHO. CONTROVÉRSIA.

Com o advento da EC/45, talvez um dos temas mais discutidos tenha sido acerca de qual instituto prescricional seria o aplicável aos casos de indenização por danos morais e materiais. Passados cinco anos e diversos posicionamentos distintos, o TST parece sinalizar uma pacificação do tema.

Atualmente, embora sejam tais danos decorrentes diretamente da relação de trabalho e, portanto, de natureza inerentemente trabalhista, há espaço para a aplicação tanto da prescrição clássica do Direito do Trabalho (artigo 7º, XXIX, da CF), quanto da prescrição civil presente no artigo 206, § 3º, V, do CC.

Isto porque, com a alteração da competência material para julgar tais casos, decorrente da EC/45 e o julgamento do Conflito de Competência nº 7.204/MG pelo STF, surgiu como elemento nuclear para definir a prescrição aplicável a observância à segurança jurídica.

Explica-se: o TST entende não ser razoável aplicar a prescrição trabalhista aos casos nos quais a lesão ocorreu antes do advento da EC/45, quando a jurisprudência pacífica, inclusive do STF, era no sentido de que a competência material – e, consequentemente, a prescrição a ser aplicada – era da Justiça Comum.

Assim, para os casos em que as lesões se deram antes da vigência da Emenda Constitucional nº 45/2004, a prescrição incidente é a de ordem civil, em caráter excepcional. A partir de tal data, aplica-se o artigo 7º, XXIX, da Carta Magna.

Bem resume o acima exposto o acórdão no processo TST-RR-1107/2006-007-01-00, de lavra do Min. Barros Levenhagen, da 4ª Turma, publicado em 30.4.2009, assim ementado:

“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAL E MATERIAL PROVENIENTES DE INFORTÚNIO DO TRABALHO. AJUIZAMENTO NA JUSTIÇA COMUM ANTERIORMENTE AO JULGAMENTO DO CC Nº 7204/MG PELO STF . REGRA DE TRANSIÇÃO. DIREITO ADQUIRIDO AO PRAZO DE PRESCRIÇÃO DO DIREITO CIVIL EM DETRIMENTO DO PRAZO PRESCRICIONAL TRABALHISTA. PROVIMENTO. I - Tendo em conta a singularidade de as indenizações por danos material e moral, oriundos de infortúnios do trabalho, terem sido equiparadas aos direitos trabalhistas, a teor da norma do artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição, não se revela juridicamente consistente a tese de que a prescrição do direito de ação devesse observar o prazo prescricional do Direito Civil. II - É que se o acidente de trabalho e a moléstia profissional são infortúnios intimamente relacionados ao contrato de trabalho, e por isso só os empregados é que têm direito aos benefícios acidentários, impõe-se a conclusão de a indenização prevista no artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição, se caracterizar como direito genuinamente trabalhista, atraindo por conta disso a prescrição do artigo 7º, inciso XXIX, da Constituição. III - Essa conclusão não é infirmável pela pretensa circunstância de a indenização prevista na norma constitucional achar-se vinculada à responsabilidade civil do empregador. Isso nem tanto pela evidência de ela reportar-se, na realidade, ao artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição, mas, sobretudo pela constatação de a pretensão indenizatória provir não da culpa aquiliana, mas da culpa contratual do empregador, extraída da não-observância dos deveres contidos no artigo 157 da CLT. IV - Não obstante tais considerações, é preciso alertar para a peculiaridade de a ação ora ajuizada o ter sido anteriormente perante a Justiça Comum, época em que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal era uníssona de a competência material ser da Justiça dos Estados e do Distrito Federal e não da Justiça do Trabalho. V - Com a superveniência da Emenda Constitucional nº 45/2004, o STF, que num primeiro momento entendera pela manutenção da competência da Justiça Comum, alterou sua jurisprudência com o julgamento do conflito de competência nº 7204/MG, em que foi relator o Ministro Carlos Britto, passando a sufragar a tese de que a competência material doravante seria do Judiciário do Trabalho. VI - Conquanto a prescrição seja instituto de direito material e a competência, de direito processual, é inegável a interligação sistêmica de ambos, de tal modo que, em atenção ao princípio da segurança jurídica, impõe-se priorizar a prescrição do Direito Civil em detrimento da prescrição do Direito do Trabalho, nesse período de transição da jurisprudência da Suprema Corte”.

Definida a prescrição aplicável e seus termos circunstanciais, o TST se deparou com uma nova controvérsia, a qual ainda não possui definição pacífica pela SBDI-1/TST: esta regra apresentada seria específica e exclusiva aos casos em que os danos morais e materiais são oriundos de acidente do trabalho (e doença profissional), ou seria aplicável em qualquer pretensão semelhante, desde que oriunda do contrato laboral?

Ainda não há decisão tratando especificamente o caso. Os poucos processos que discutiam exatamente esta matéria foram julgados com decisões que passavam ao largo da questão ou esbarraram em óbices ao conhecimento.

Todavia, na opinião deste, resta cristalina a exclusividade da tese apenas aos casos oriundos de acidentes do trabalho.

Isto porque o próprio STF – ao decidir pela competência da Justiça do Trabalho no CC 7204/MG, julgado pelo Tribunal Pleno e cujo acórdão foi publicado em 9.12.2005 – se refere de forma cristalina aos casos de danos morais por acidentes laborais, concluindo que a competência daquela adveio não da EC/45, mas da própria Constituição de 1988. O motivo pelo qual não se alterou a competência em momento anterior era a influência de jurisprudências passadas que se baseavam em Constituições de antes e a leitura que faziam do Artigo 109, I, da Carta Magna.

“EMENTA: CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA JUDICANTE EM RAZÃO DA MATÉRIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PATRIMONIAIS DECORRENTES DE ACIDENTE DO TRABALHO, PROPOSTA PELO EMPREGADO EM FACE DE SEU (EX-)EMPREGADOR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. ART. 114 DA MAGNA CARTA. REDAÇÃO ANTERIOR E POSTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/04. EVOLUÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PROCESSOS EM CURSO NA JUSTIÇA COMUM DOS ESTADOS. IMPERATIVO DE POLÍTICA JUDICIÁRIA. Numa primeira interpretação do inciso I do art. 109 da Carta de Outubro, o Supremo Tribunal Federal entendeu que as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho, ainda que movidas pelo empregado contra seu (ex-)empregador, eram da competência da Justiça comum dos Estados-Membros. 2. Revisando a matéria, porém, o Plenário concluiu que a Lei Republicana de 1988 conferiu tal competência à Justiça do Trabalho. Seja porque o art. 114, já em sua redação originária, assim deixava transparecer, seja porque aquela primeira interpretação do mencionado inciso I do art. 109 estava, em boa verdade, influenciada pela jurisprudência que se firmou na Corte sob a égide das Constituições anteriores”.

A questão da interpretação do art. 109 da CF é de extrema importância para restringir a prescrição civil apenas aos casos de acidentes do trabalho, já que se demonstra que a controvérsia em comento adveio de norma que tratava explícita e unicamente (no tema discutido) de acidente laboral. A controvérsia, portanto, era quanto aos casos que versavam pretensões por acidente do trabalho.

Corrobora o exposto a própria jurisprudência do STF, que definia a competência da Justiça do Trabalho para casos de danos morais não decorrentes de tais infortúnios antes mesmo da vigência da EC/45, abaixo exemplificada:

EMENTA: Justiça do Trabalho: competência: ação de reparação de danos decorrentes da imputação caluniosa irrogada ao trabalhador pelo empregador a pretexto de justa causa para a despedida e, assim, decorrente da relação de trabalho, não importando deva a controvérsia ser dirimida à luz do Direito Civil” (PROC. STF-RE-238737/SP – 1ª Turma – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – Pub. DJ 5.2.1999).

Tem-se, portanto, que não apenas a controvérsia quanto à competência se originava de dispositivo que tratava exclusivamente de acidente de trabalho, como também que a jurisprudência sinalizava desde antes da vigência da EC/45 que a competência material para danos morais não oriundos de acidentes do trabalho era da Justiça do Trabalho.

Não havia, portanto, qualquer controvérsia quanto a estes casos, motivo pelo qual, por conseqüência, não haveria, também, necessidade de fazer incidir a prescrição civil e o princípio da segurança jurídica. Os fundamentos nucleares da tese em comento são afastados, não restando qualquer motivo para incidir o instituto prescricional civil.

Conclui-se, ante o exposto, que a prescrição civil tem sua aplicabilidade na Justiça do Trabalho em um âmbito extremamente restrito: casos de danos morais e materiais cuja lesão ocorreu antes da vigência da EC/45 e decorrentes de acidente do trabalho ou doença profissional. Nos demais casos se aplica a prescrição trabalhista.

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