segunda-feira, 30 de novembro de 2009

DEMISSÃO POR JUSTA CAUSA. USO DE E-MAIL DA EMPRESA PARA ENVIO DE PORNOGRAFIA. PROVA OBTIDA LICITAMENTE.

PROCESSO: TST-RR-613/2000-013-10-00

Ainda que este blog possua como principal finalidade discutir os temas atuais que surgem no Tribunal Superior do Trabalho, às vezes trará tópicos não tão recentes, mas de extrema importância e controvérsia.

O processo em análise hoje diz respeito a um empregado que foi demitido por justa causa depois que a empresa em que trabalhava rastreou o e-mail corporativo usado por este funcionário e descobriu que ele o utilizava também para repassar conteúdo pornográfico.

Descoberto pelo patrão, o empregado foi demitido por justa causa e logo ajuizou Reclamação Trabalhista visando desconstituí-la.

A discussão jurídica se limitou a determinar se a prova obtida (o conteúdo das mensagens) pela empregadora seria ou não lícita, violaria ou não o direito à intimidade do empregado.

O processo chegou ao TST e o voto do Ministro João Oreste Dalazen ganhou aspecto histórico por sua abordagem completa acerca do tema: tratou tanto da distinção entre o e-mail corporativo e o e-mail particular, quanto da incidência ao caso do direito à privacidade e à intimidade do empregado, bem como o direito de propriedade do empregador.

A diferenciação do correio eletrônico corporativo para o particular é básica. Enquanto aquele é de propriedade da empresa e tem, regra geral, como única finalidade o envio de informações profissionais, o e-mail particular é aquele pertencente direta e unicamente ao próprio trabalhador.

Deste modo, partiu-se do princípio de que a utilização particular de e-mail corporativo automaticamente já o desvia de sua finalidade. Se o computador de trabalho e o seu e-mail corporativo são ferramentas laborais e de propriedade do empregador, pode este realizar a fiscalização de seu conteúdo para que não sejam utilizados para outros fins que não o trabalho, bem como evitar quaisquer prejuízos que o empregado possa ocasionar, já que as mensagens enviadas teriam direta e inequívoca relação com a empresa.

A ementa do processo em questão bem apresenta as peculiaridades do caso, in verbis:

“PROVA ILÍCITA. -E-MAIL- CORPORATIVO. JUSTA CAUSA. DIVULGAÇÃO DE MATERIAL PORNOGRÁFICO. 1. Os sacrossantos direitos do cidadão à privacidade e ao sigilo de correspondência, constitucionalmente assegurados, concernem à comunicação estritamente pessoal, ainda que virtual (-e-mail- particular). Assim, apenas o e-mail pessoal ou particular do empregado, socorrendo-se de provedor próprio, desfruta da proteção constitucional e legal de inviolabilidade. 2. Solução diversa impõe-se em se tratando do chamado -e-mail- corporativo, instrumento de comunicação virtual mediante o qual o empregado louva-se de terminal de computador e de provedor da empresa, bem assim do próprio endereço eletrônico que lhe é disponibilizado igualmente pela empresa. Destina-se este a que nele trafeguem mensagens de cunho estritamente profissional. Em princípio, é de uso corporativo, salvo consentimento do empregador. Ostenta, pois, natureza jurídica equivalente à de uma ferramenta de trabalho proporcionada pelo empregador ao empregado para a consecução do serviço. 3. A estreita e cada vez mais intensa vinculação que passou a existir, de uns tempos a esta parte, entre Internet e/ou correspondência eletrônica e justa causa e/ou crime exige muita parcimônia dos órgãos jurisdicionais na qualificação da ilicitude da prova referente ao desvio de finalidade na utilização dessa tecnologia, tomando-se em conta, inclusive, o princípio da proporcionalidade e, pois, os diversos valores jurídicos tutelados pela lei e pela Constituição Federal. A experiência subministrada ao magistrado pela observação do que ordinariamente acontece revela que, notadamente o -e-mail- corporativo, não raro sofre acentuado desvio de finalidade, mediante a utilização abusiva ou ilegal, de que é exemplo o envio de fotos pornográficas. Constitui, assim, em última análise, expediente pelo qual o empregado pode provocar expressivo prejuízo ao empregador. 4. Se se cuida de -e-mail- corporativo, declaradamente destinado somente para assuntos e matérias afetas ao serviço, o que está em jogo, antes de tudo, é o exercício do direito de propriedade do empregador sobre o computador capaz de acessar à INTERNET e sobre o próprio provedor. Insta ter presente também a responsabilidade do empregador, perante terceiros, pelos atos de seus empregados em serviço (Código Civil, art. 932, inc. III), bem como que está em xeque o direito à imagem do empregador, igualmente merecedor de tutela constitucional. Sobretudo, imperativo considerar que o empregado, ao receber uma caixa de -e-mail- de seu empregador para uso corporativo, mediante ciência prévia de que nele somente podem transitar mensagens profissionais, não tem razoável expectativa de privacidade quanto a esta, como se vem entendendo no Direito Comparado (EUA e Reino Unido). 5. Pode o empregador monitorar e rastrear a atividade do empregado no ambiente de trabalho, em -e-mail- corporativo, isto é, checar suas mensagens, tanto do ponto de vista formal quanto sob o ângulo material ou de conteúdo. Não é ilícita a prova assim obtida, visando a demonstrar justa causa para a despedida decorrente do envio de material pornográfico a colega de trabalho. Inexistência de afronta ao art. 5º, incisos X, XII e LVI, da Constituição Federal. 6. Agravo de Instrumento do Reclamante a que se nega provimento” (PROC. TST-RR-613/2000-013-10-00 – 1ª Turma – Rel. Min. João Oreste Dalazen – Pub. DJ 10.6.2005).

Concluiu-se, de modo correto à minha vista, que tem o empregador total direito de verificar não apenas o número de correios eletrônicos enviados pelo seu funcionário através de conta de e-mail da empresa, mas, também, o conteúdo daqueles. Estas informações foram, portanto, obtidas de modo integralmente legal, não havendo falar em prova ilícita. Também não haverá qualquer invasão de privacidade ou violação à intimidade obreira.

Frisa-se que este tipo de fiscalização é exclusivamente para o e-mail corporativo, do qual a empresa é dona. Na próxima postagem, serão analisadas as possibilidades e restrições de fiscalização do e-mail particular utilizado pelo empregado.

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domingo, 29 de novembro de 2009

EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. VERIFICAÇÃO DA DATA DO TRÂNSITO EM JULGADO DA AÇÃO FEDERAL. FLEXIBILIZAÇÃO DA SÚMULA 126/TST.

PROCESSO TST-E-RR-87/2004-006-10-00

A questão dos expurgos inflacionários e sua incidência na multa de 40% do FGTS parece finalmente não mais receber resistência no âmbito do TST e a sua tese pacífica encontra-se consignada nas Orientações Jurisprudenciais nº 341 e nº 344 da SBDI-1/TST.

O tema de hoje discute principalmente os termos iniciais da prescrição a incidir nos casos em que se discutem os expurgos sob a luz da OJ 344-SBDI-1/TST, onde se define que: “O termo inicial do prazo prescricional para o empregado pleitear em juízo diferenças da multa do FGTS, decorrentes dos expurgos inflacionários, deu-se com a vigência da Lei Complementar nº 110, em 30.06.2001, salvo comprovado trânsito em julgado de decisão proferida em ação proposta
anteriormente na Justiça Federal, que reconheça o direito à atualização do saldo da conta vinculada”.

Ou seja: tem o empregado até 30.6.2003 para pleitear os expurgos não pagos. A exceção se dá quando o reclamante já possuía, antes da vigência da Lei Complementar em questão, ação judicial requerendo a atualização do saldo de sua conta. Nestes casos, a prescrição iniciará quando do trânsito em julgado daquela.

Todavia, enquanto o mérito prescricional, em si, está sob fundamentos concretos, o TST tem aplicado a estes casos uma prerrogativa processual que, para alguns, consistiria em afronta à Súmula 126/TST e sua proibição de revolvimento fático-probatório.

Trata-se de verificar a data do trânsito em julgado da ação na Justiça Federal no próprio documento trasladado aos autos, ainda que esta informação não conste do acórdão do TRT.

A rigor, caberia à parte prequestionar tal data para demonstrar em sede regional o óbice à aplicação da prescrição. Entretanto, o TST tem entendido que este dado seria, a rigor, premissa incontroversa nos autos, não ensejando o obstáculo da Súmula 126/TST.

Neste sentido, assim se pronunciou a SBDI-1/TST recentemente:

“RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 11.496/2007 - PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO ÀS DIFERENÇAS DA INDENIZAÇÃO DE 40% DO FGTS - EXPURGOS INFLACIONÁRIOS - VERIFICAÇÃO DA DATA DO TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO PROFERIDA PELA JUSTIÇA FEDERAL - FATO INCONTROVERSO - POSSIBILIDADE. Esta Corte Superior tem adotado posicionamento no sentido de ser autorizada a verificação da data de trânsito em julgado da decisão proferida pela Justiça Federal que reconheceu o direito aos expurgos inflacionários quando sobre ela não pesa nenhuma controvérsia. É o caso dos autos, em que, na petição inicial, o reclamante aludiu à data de trânsito em julgado da decisão proferida na Justiça Federal, 16/11/2001, e a reclamada, por sua vez, ao contestar o pedido, não impugnou a referida data, limitando-se a argüir a prescrição contada a partir do término da relação de emprego. Note-se que a referida data era totalmente irrelevante para a tese jurídica adotada pela Corte Regional, cujo entendimento foi no sentido de que a prescrição teve início com a ruptura do contrato de trabalho, razão pela qual se limitou a declinar seu posicionamento a respeito da matéria, muito embora os argumentos expendidos em sede de recurso ordinário do reclamante fossem no sentido da inexistência de prescrição, observada a contagem a partir da decisão prolatada na Justiça Federal” (PROC. TST-E-RR-87/2004-006-10-00 – SBDI-1 – Rel. Min. Lelio Bentes Corrêa – Pub. DJ 5.12.2008).


Em minha opinião, acerta o Tribunal. Seria extremo rigor formal e completo desrespeito à celeridade processual e à razoabilidade requerer que até fatos incontroversos sejam expressamente consignados no acórdão regional. A Súmula 126/TST, então, deve ter sua incidência limitada apenas àqueles elementos fáticos que configurem parte do litígio, sem obstar a análise dos aspectos que, ainda que sejam relevantes, sequer foram objeto de discussão ou de impugnação.

A exceção ao posicionamento da SBDI-1/TST é, obviamente, nos casos onde a data do trânsito em julgado restou controversa nos autos.

sábado, 28 de novembro de 2009

ENVIO DE PETIÇÃO VIA FAX. PEÇAS ENVIADAS POR FAC-SÍMILE DEVEM SER IGUAIS ÀS ORIGINAIS. EXCEÇÃO.

O TST divulgou notícia em 25.11.2009 referente à necessidade legal de que o recurso enviado via fac-símile possua estritamente as mesmas peças que o original. Afirmou que “A Seção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho (SDI-1) não reconheceu recurso do Banco Itaú S/A, pela ausência de duas folhas no documento original que estavam na primeira versão enviada por fax. De acordo com a decisão, há necessidade de concordância entre o recurso remetido e o original recebido posteriormente pelo Tribunal”.

Todavia, é necessário frisar que, enquanto esta seja, de fato, a regra aplicável a este meio de interposição recursal, há exceções que merecem significativa atenção.

Há pouco tempo atrás, teve a SBDI-1/TST a oportunidade de julgar a regularidade de agravo de instrumento interposto por meio eletrônico, momento em que se trasladou apenas o recurso propriamente dito. As fotocópias que constituíam os autos, bem como a declaração de autenticidade destas, vieram trasladadas apenas com a peça original.

Utilizando-se do argumento de que o próprio objetivo da Lei nº 9.800/99 era facilitar a protocolização de peças, a Subseção entendeu que obrigar a parte a trasladar todas as fotocópias via fac-símile ou meio semelhante esvaziaria por completo a benesse legal, já que a agravante já teria que possuir todos os documentos xerocados já no octódio legal.

Ademais, houve observância ao princípio da economia e celeridade processual, pois o envio e a autuação de agravos de instrumento em que fossem obrigatório o traslado por meio eletrônico seriam de quase o dobro do número de páginas, sem qualquer acréscimo em conteúdo.

Assim restou ementada a decisão da SBDI-1/TST:

“EMBARGOS. AGRAVO DE INSTRUMENTO. INTERPOSIÇÃO POR MEIO ELETRÔNICO. PEÇAS DE TRASLADO OBRIGATÓRIO E RESPECTIVA DECLARAÇÃO DE AUTENTICIDADE TRAZIDAS APENAS COM OS ORIGINAIS DA PETIÇÃO DE AGRAVO. A internet é uma realidade que não pode mais ser contestada. Uma das vantagens, entre outras milhares, oferecidas pela rede mundial de informações é a interposição de recursos por meio eletrônico. A Lei n.º 9.800/99, a seu turno, autoriza a interposição de recurso via fac-símile ou similar desde que a parte envie os originais no prazo de cinco dias em perfeita concordância de conteúdo com a petição remetida via correio eletrônico. No caso dos autos, o agravo de instrumento foi interposto por meio eletrônico, protocolizado no prazo legal, e o original da petição, juntamente com as cópias, também foi protocolizado no prazo estabelecido pela lei. Não há falar, pois, em deficiência do traslado por não terem sido encaminhadas, via correio eletrônico, as peças de traslado obrigatório, bem como a declaração de sua autenticidade. A colenda Turma, ao impor tal exigência, por certo cerceou o direito de defesa da parte, incorrendo em violação do artigo 5º, LV, da Constituição da República. Recurso de embargos conhecido e provido” (PROC. TST-E-A-AIRR-3844/2005-016-12-40 – SBDI-1 – Rel. Min. Lelio Bentes Corrêa – Pub. DJ 15.5.2009).

Deste modo, resta plenamente possível a interposição de agravo de instrumento via fac-símile ou outro meio de natureza equivalente, com o traslado das fotocópias e da declaração de autenticidade apenas quando da protocolização do recurso original, obedecido o prazo subseqüente de cinco dias, previsto na própria Lei nº 9.800/99.

Frisa-se que a Presidência do TST tem atualmente denegado seguimento a agravos de instrumento por ausência de pressupostos extrínsecos antes mesmo da distribuição dos autos a alguma Turma do TST, e tem utilizado o entendimento de que não seria possível a apresentação das aludidas fotocópias apenas durante a interposição do AIRR original, em clara inobservância à jurisprudência pacífica da própria SBDI-1/TST.

A interposição de agravo (art. 325 do Regimento Interno/TST), no caso, costuma determinar a reforma do julgado e a conseqüente declaração da regularidade do traslado por alguma das Turmas do TST, que não coadunam com a tese exarada nos dias de hoje pela Presidência.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

DANOS MORAIS E MATERIAIS. PRESCRIÇÃO. APLICAÇÃO DA "REGRA ESPECIAL" APENAS AOS CASOS ORIUNDOS DE ACIDENTES DO TRABALHO. CONTROVÉRSIA.

Com o advento da EC/45, talvez um dos temas mais discutidos tenha sido acerca de qual instituto prescricional seria o aplicável aos casos de indenização por danos morais e materiais. Passados cinco anos e diversos posicionamentos distintos, o TST parece sinalizar uma pacificação do tema.

Atualmente, embora sejam tais danos decorrentes diretamente da relação de trabalho e, portanto, de natureza inerentemente trabalhista, há espaço para a aplicação tanto da prescrição clássica do Direito do Trabalho (artigo 7º, XXIX, da CF), quanto da prescrição civil presente no artigo 206, § 3º, V, do CC.

Isto porque, com a alteração da competência material para julgar tais casos, decorrente da EC/45 e o julgamento do Conflito de Competência nº 7.204/MG pelo STF, surgiu como elemento nuclear para definir a prescrição aplicável a observância à segurança jurídica.

Explica-se: o TST entende não ser razoável aplicar a prescrição trabalhista aos casos nos quais a lesão ocorreu antes do advento da EC/45, quando a jurisprudência pacífica, inclusive do STF, era no sentido de que a competência material – e, consequentemente, a prescrição a ser aplicada – era da Justiça Comum.

Assim, para os casos em que as lesões se deram antes da vigência da Emenda Constitucional nº 45/2004, a prescrição incidente é a de ordem civil, em caráter excepcional. A partir de tal data, aplica-se o artigo 7º, XXIX, da Carta Magna.

Bem resume o acima exposto o acórdão no processo TST-RR-1107/2006-007-01-00, de lavra do Min. Barros Levenhagen, da 4ª Turma, publicado em 30.4.2009, assim ementado:

“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAL E MATERIAL PROVENIENTES DE INFORTÚNIO DO TRABALHO. AJUIZAMENTO NA JUSTIÇA COMUM ANTERIORMENTE AO JULGAMENTO DO CC Nº 7204/MG PELO STF . REGRA DE TRANSIÇÃO. DIREITO ADQUIRIDO AO PRAZO DE PRESCRIÇÃO DO DIREITO CIVIL EM DETRIMENTO DO PRAZO PRESCRICIONAL TRABALHISTA. PROVIMENTO. I - Tendo em conta a singularidade de as indenizações por danos material e moral, oriundos de infortúnios do trabalho, terem sido equiparadas aos direitos trabalhistas, a teor da norma do artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição, não se revela juridicamente consistente a tese de que a prescrição do direito de ação devesse observar o prazo prescricional do Direito Civil. II - É que se o acidente de trabalho e a moléstia profissional são infortúnios intimamente relacionados ao contrato de trabalho, e por isso só os empregados é que têm direito aos benefícios acidentários, impõe-se a conclusão de a indenização prevista no artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição, se caracterizar como direito genuinamente trabalhista, atraindo por conta disso a prescrição do artigo 7º, inciso XXIX, da Constituição. III - Essa conclusão não é infirmável pela pretensa circunstância de a indenização prevista na norma constitucional achar-se vinculada à responsabilidade civil do empregador. Isso nem tanto pela evidência de ela reportar-se, na realidade, ao artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição, mas, sobretudo pela constatação de a pretensão indenizatória provir não da culpa aquiliana, mas da culpa contratual do empregador, extraída da não-observância dos deveres contidos no artigo 157 da CLT. IV - Não obstante tais considerações, é preciso alertar para a peculiaridade de a ação ora ajuizada o ter sido anteriormente perante a Justiça Comum, época em que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal era uníssona de a competência material ser da Justiça dos Estados e do Distrito Federal e não da Justiça do Trabalho. V - Com a superveniência da Emenda Constitucional nº 45/2004, o STF, que num primeiro momento entendera pela manutenção da competência da Justiça Comum, alterou sua jurisprudência com o julgamento do conflito de competência nº 7204/MG, em que foi relator o Ministro Carlos Britto, passando a sufragar a tese de que a competência material doravante seria do Judiciário do Trabalho. VI - Conquanto a prescrição seja instituto de direito material e a competência, de direito processual, é inegável a interligação sistêmica de ambos, de tal modo que, em atenção ao princípio da segurança jurídica, impõe-se priorizar a prescrição do Direito Civil em detrimento da prescrição do Direito do Trabalho, nesse período de transição da jurisprudência da Suprema Corte”.

Definida a prescrição aplicável e seus termos circunstanciais, o TST se deparou com uma nova controvérsia, a qual ainda não possui definição pacífica pela SBDI-1/TST: esta regra apresentada seria específica e exclusiva aos casos em que os danos morais e materiais são oriundos de acidente do trabalho (e doença profissional), ou seria aplicável em qualquer pretensão semelhante, desde que oriunda do contrato laboral?

Ainda não há decisão tratando especificamente o caso. Os poucos processos que discutiam exatamente esta matéria foram julgados com decisões que passavam ao largo da questão ou esbarraram em óbices ao conhecimento.

Todavia, na opinião deste, resta cristalina a exclusividade da tese apenas aos casos oriundos de acidentes do trabalho.

Isto porque o próprio STF – ao decidir pela competência da Justiça do Trabalho no CC 7204/MG, julgado pelo Tribunal Pleno e cujo acórdão foi publicado em 9.12.2005 – se refere de forma cristalina aos casos de danos morais por acidentes laborais, concluindo que a competência daquela adveio não da EC/45, mas da própria Constituição de 1988. O motivo pelo qual não se alterou a competência em momento anterior era a influência de jurisprudências passadas que se baseavam em Constituições de antes e a leitura que faziam do Artigo 109, I, da Carta Magna.

“EMENTA: CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA JUDICANTE EM RAZÃO DA MATÉRIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PATRIMONIAIS DECORRENTES DE ACIDENTE DO TRABALHO, PROPOSTA PELO EMPREGADO EM FACE DE SEU (EX-)EMPREGADOR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. ART. 114 DA MAGNA CARTA. REDAÇÃO ANTERIOR E POSTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/04. EVOLUÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PROCESSOS EM CURSO NA JUSTIÇA COMUM DOS ESTADOS. IMPERATIVO DE POLÍTICA JUDICIÁRIA. Numa primeira interpretação do inciso I do art. 109 da Carta de Outubro, o Supremo Tribunal Federal entendeu que as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho, ainda que movidas pelo empregado contra seu (ex-)empregador, eram da competência da Justiça comum dos Estados-Membros. 2. Revisando a matéria, porém, o Plenário concluiu que a Lei Republicana de 1988 conferiu tal competência à Justiça do Trabalho. Seja porque o art. 114, já em sua redação originária, assim deixava transparecer, seja porque aquela primeira interpretação do mencionado inciso I do art. 109 estava, em boa verdade, influenciada pela jurisprudência que se firmou na Corte sob a égide das Constituições anteriores”.

A questão da interpretação do art. 109 da CF é de extrema importância para restringir a prescrição civil apenas aos casos de acidentes do trabalho, já que se demonstra que a controvérsia em comento adveio de norma que tratava explícita e unicamente (no tema discutido) de acidente laboral. A controvérsia, portanto, era quanto aos casos que versavam pretensões por acidente do trabalho.

Corrobora o exposto a própria jurisprudência do STF, que definia a competência da Justiça do Trabalho para casos de danos morais não decorrentes de tais infortúnios antes mesmo da vigência da EC/45, abaixo exemplificada:

EMENTA: Justiça do Trabalho: competência: ação de reparação de danos decorrentes da imputação caluniosa irrogada ao trabalhador pelo empregador a pretexto de justa causa para a despedida e, assim, decorrente da relação de trabalho, não importando deva a controvérsia ser dirimida à luz do Direito Civil” (PROC. STF-RE-238737/SP – 1ª Turma – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – Pub. DJ 5.2.1999).

Tem-se, portanto, que não apenas a controvérsia quanto à competência se originava de dispositivo que tratava exclusivamente de acidente de trabalho, como também que a jurisprudência sinalizava desde antes da vigência da EC/45 que a competência material para danos morais não oriundos de acidentes do trabalho era da Justiça do Trabalho.

Não havia, portanto, qualquer controvérsia quanto a estes casos, motivo pelo qual, por conseqüência, não haveria, também, necessidade de fazer incidir a prescrição civil e o princípio da segurança jurídica. Os fundamentos nucleares da tese em comento são afastados, não restando qualquer motivo para incidir o instituto prescricional civil.

Conclui-se, ante o exposto, que a prescrição civil tem sua aplicabilidade na Justiça do Trabalho em um âmbito extremamente restrito: casos de danos morais e materiais cuja lesão ocorreu antes da vigência da EC/45 e decorrentes de acidente do trabalho ou doença profissional. Nos demais casos se aplica a prescrição trabalhista.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

OJ 245-SBDI-1/TST. ATRASO SEM A REALIZAÇÃO DE ATOS PROCESSUAIS. REVELIA NÃO CONFIGURADA.

PROCESSO: E-RR-2089/2002-029-12-00

Hoje a SBDI-1/TST decidiu não conhecer do recurso de embargos da reclamante que versavam contrariedade à OJ 245-SBDI-1/TST, verbis: "REVELIA. ATRASO. AUDIÊNCIA. Inexiste previsão legal tolerando atraso no horário de comparecimento daparte na audiência".

O caso em concreto aborda um atraso de um minuto do preposto da reclamada, a contar da abertura da audiência inaugural. Em que pese já estar aberta, o TRT consignou que não houve a realização de qualquer ato processual até a sua chegada.

A Turma/TST entendeu que não houve a revelia ante a particularidade do caso, no qual o atraso de poucos minutos não seria suficiente a configurar a incidência do aludido instituto. Assim restou ementado o acórdão:

"RECURSO DE REVISTA. ATRASO NA AUDIÊNCIA - REVELIA. A regra previstano artigo 844 a Consolidação das Leis do Trabalho, relativa à revelia,deve ser analisada sob a ótica do bom senso e da razoabilidade. Se ocomparecimento do reclamado à audiência ocorreu antes que fosse possível arealização de qualquer ato processual, não há que se reconhecer suarevelia diante da ausência de preclusão. Há que se considerar que aredação conferida à Orientação Jurisprudencial nº 245 da SBDI-1, segundo aqual Inexiste previsão legal tolerando atraso no horário decomparecimento da parte na audiência , não é óbice à validação, no caso emquestão, do ato de comparecimento do reclamado três minutos após a horamarcada para a audiência, já que devem ser analisadas as particularidadesde cada caso. Recurso de revista não conhecido".

O relator do recurso de embargos obreiro, Juiz Convocado Douglas Alencar, ressalvou entendimento pessoal, mas decidiu nos moldes da OJ em comento e afirmou que esta não apresentava qualquer exceção ou flexibilização, motivo pelo qual qualquer atraso, ainda que de minutos, configuraria a revelia.

Todavia, foi aberta divergência pelo Ministro Reis de Paula, que consignou que o atraso está previsto na Súmula, mas as circunstâncias nas quais se configuraria tal atraso não estão presentes.

Logo, acompanhado pela SBDI-1, salvo pela Min. Calsing, o posicionamento prevalecente foi o de que o atraso a que alude a OJ 245-SBDI-1/TST não seria configurado pelo horário propriamente dito (atraso no relógio), mas, sim, pela realização ou não de atos processuais em momento anterior à chegada da parte.

Frisa-se que a Min. Calsing, para determinar a revelia, entendia que a própria abertura da audiência já seria ato processual, motivo pelo qual, por qualquer ângulo, haveria o atraso patronal.

Na minha opinião, a SBDI-1/TST aplicou o correto entendimento, muito em vista da inexistência de prejuízo já que não houve qualquer ato realizado anteriormente, da comprovada existência do ânimo de se defender da reclamada e, também, do próprio bom senso e da razoabilidade.

Entretanto, a OJ em comento afirma, sim, que o atraso seria configurado a partir do horário de início da audiência. Como restou acima relatado, sendo o atraso determinado pela realização ou não de atos processuais, seria o caso de reforma da Orientação Jurisprudencial nº 245-SBDI-1/TST para que esta tenha a redação adequada ao novo entendimento desta Subseção.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

OJ 349-SBDI-1/TST. ELEMENTO HÁBIL A COMPROVAR A REVOGAÇÃO TÁCITA DE PROCURAÇÃO ANTERIOR. DATA DA OUTORGA x DATA DA JUNTADA.

PROCESSO: TST-E-RR-1394/2002-001-05-00

A Orientação Jurisprudencial nº 349-SBDI-1/TST aduz que: “A juntada de nova procuração aos autos, sem ressalva de poderes conferidos ao antigo patrono, implica revogação tácita do mandato anterior”.

Tal dispositivo, recentemente, gerou importante discussão acerca do elemento a ser considerado para permitir a revogação tácita de uma procuração por outra nos autos.

Em outras palavras: seria a data da outorga do instrumento de mandato que determinaria qual procuração revogaria qual; ou seria a data da juntada deste documento nos autos que permitiria concluir por qual instrumento teria efeitos?

No caso dos autos, a procuração que outorgou poderes aos advogados da reclamada nas instâncias ordinárias foi juntada quando da apresentação da contestação e possuíam data de determinado ano. Já o instrumento de mandato que outorgava poderes ao subscritor do recurso de embargos foi com este protocolizado, mas possuía data de outorga anterior à daquele primeiro documento.

A relatora do acórdão, Ministra Maria de Assis Calsing, propôs voto no sentido de que a procuração que outorgava poderes ao subscritor do recurso de embargos à SBDI-1, por ser datada em momento anterior àquela já existente nos autos, que constituía os advogados das instâncias anteriores, estaria revogada nos moldes do que dispõe a Orientação Jurisprudencial nº 349 da SBDI-1/TST.

Todavia, após extenso debate, a tese vencedora foi bem resumida pelas razões expendidas pelo Ministro Aloysio Corrêa da Veiga, que aduziu que fugiria do razoável, por exemplo, exigir que grandes empresas possuíssem uma única procuração contendo seus milhares de advogados de todas as localidades, ou que toda vez que houvesse mudança nas procurações de escritórios das instâncias originais, necessariamente haveria alteração dos instrumentos dos graus posteriores, pois só assim se elidiria a revogação tácita tomando por base a data da outorga da procuração.

Em resumo, restou confirmado que o elemento hábil a ensejar a incidência da revogação tácita prevista na Orientação Jurisprudencial nº 349 da SBDI-1/TST é a data da juntada da procuração aos autos, e não a data da sua outorga.

Exemplifica-se: o instrumento A, datado de 2005 e juntado aos autos em 2008, não estaria revogado pelo instrumento B, datado de 2006 e juntado aos autos em 2007. Como é a data em que foi anexada aos autos que determina a revogação, a procuração A, juntada em 2008, estaria revogando a procuração B, juntada anteriormente, em 2007.

O processo alvo, enquanto ainda não foi publicado, tem a sua tese corroborada por recente acórdão prolatado pela própria Min. Calsing, já observando o novo entendimento da SBDI-1/TST, verbis:

“Alega o Embargante a ocorrência de manifesto equívoco por parte deste órgão julgador na apreciação dos pressupostos extrínsecos do seu Recurso de Embargos, ao argumento de que o que fixa revogação da procuração não é a data da outorga, mas sim a data da juntada do instrumento de mandato nos autos. Afirma que esse foi o entendimento exarado por esta Subseção quando do julgamento do processo E-RR-1394/2002-001-05-00.

De fato, esta Subseção, na sessão do dia 21/5/2009, concluiu que a interpretação que deve ser dada à Orientação Jurisprudencial n.º 349 da SBDI-1 é a de que deve ser observada a data de juntada do instrumento de mandato nos autos e não a data de sua outorga como fator preponderante para se concluir pela sua revogação.

Dessarte, apesar do entendimento em contrário desta Relatora, adoto o posicionamento desta Subseção, por disciplina judiciária.

Assim sendo, verifica-se, tal como alegado pelo Embargante, a ocorrência das hipóteses dos arts. 535 do CPC e 897-A da CLT, dá-se provimento os Embargos de Declaração, com a concessão de efeito modificativo ao julgado, passando-se à apreciação do Recurso de Embargos do Reclamado”.

Na opinião deste autor, a vertente jurisprudencial adotada pela SBDI-1 converge com o disposto na aludida Orientação Jurisprudencial, tanto literalmente – a própria OJ 349 dispõe que a revogação se dará com a juntada de nova procuração, e não com a sua outorga – quanto em seu real sentido jurídico. Não se pode concluir razoavelmente que a quebra da ordem lógica e procedimental do processo, na qual a procuração com data anterior não produziria quaisquer efeitos ainda que integralmente regular, não incorreria em cristalina afronta ao devido processo legal e à ampla defesa. Na prática, a juntada de instrumento nos autos estaria revogando toda e qualquer procuração cuja data da outorga seja anterior, estando estas já anexadas aos autos ou não.

Ademais, o artigo 687 do Código Civil (Artigo 1.319 do Antigo Código Civil), – elemento central da presente controvérsia – determina que “tanto que for comunicada ao mandatário a nomeação de outro, para o mesmo negócio, considerar-se-á revogado o mandato anterior”. A comunicação ao mandatário tratada no aludido dispositivo legal não pode ser entendida como a mera outorga de poderes, pois a constituição de novo instrumento de mandato não gera, por si só, qualquer presunção de que se comunicou tal fato aos advogados cujos poderes foram outorgados pela procuração anterior. Não podem os advogados vigiar em tempo integral seus clientes de modo a verificarem se houve nova outorga de poderes a outros profissionais.

Todavia, tal presunção é razoável e lógica se a procuração em questão é juntada aos autos. Partindo do pressuposto de que os mandatários antigos facilmente teriam ciência da nova procuração juntada ao acompanhar o processo em seus trâmites, estar-se-ia configurada a comunicação e, nos moldes do artigo 687 do Código Civil, também a revogação tácita.

Corrobora esta tese Washington de Barros Monteiro, o qual afirma que “num processo, equivalerá à referida comunicação a juntada da procuração conferida ao novo procurador”. (Direito das Obrigações; 2ª parte; página 283; 5ª edição).

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Este é a primeira postagem do blog, que tem como seu principal objetivo apresentar uma forma de a comunidade de juristras trabalhista se relacionar e discutir temas interessantes e em foco pelo Tribunal Superior do Trabalho, principalmente.

Meu nome é Mozart Victor Russomano Neto, sou advogado trabalhista do escritório Russomano Advocacia S/S e tenho o privilégio de advogar em praticamente todas as sessões da SBDI-1/TST, bem como em Turmas do TST, semanalmente. Deste modo, resolvi compartilhar as inúmeras decisões inéditas e controversas do TST neste blog.

As postagens visarão expor as decisões e, sempre que possível, haverá comentários, elogios e críticas às posturas jurídicas desenvolvidas pelos Ministros.

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As análises começarão na próxima postagem!